► Francesca POVImortalidade. Foi a primeira coisa que desejei desde o princípio. Mas até onde eu estava disposta a ir para consegui-la?
Longe. Muito longe. Estava tão obcecada com isso, que acabei trocando minha alma e mais alguns luxos por isso. Talvez fosse demais, mas eu preferia viver eternamente a ter um coração pulsante.
As minhas primeiras memórias depois da transformação envolvem muita dor, e um fogo ardente correndo pelas minhas veias, dilacerando meu corpo. Cheguei a pensar que o custo era muito grande, que eu deveria desistir. Mas então eu pensava em Robert Levinsk, e o verdadeiro motivo de eu estar sendo transformada em vampiro vinha à tona.
A eternidade junto do meu verdadeiro amor.
Robert esteve ao meu lado durante toda a transformação, me dizendo palavras tranqüilizadoras, mostrando que estava comigo para o que der e vier. Certificando-se de que eu sabia que ele não iria me abandonar.
O dia em que a transformação se deu completa era ensolarado e quente, então sair na rua estava fora de cogitação.
Não havia vestígios da tuberculose que me deixou inválida por tanto tempo. Eu estava saudável como um cavalo, e sentia que poderia correr uma maratona sem nem precisar tomar fôlego.
Logo que levantei, Rob, com ar divertido, mas temeroso, entregou-me um espelho para que eu pudesse ver o quanto mudara em três dias. A surpresa foi tanta que me fez exclamar alto.
Meus cabelos caíam em cachos castanho-dourados perfeitos um palmo abaixo dos meus ombros, minha pele era branca e brilhava a luz do abajur próximo a mim, meus olhos eram de um vermelho sangue e pareciam duas pedras preciosas, tamanho brilho. Mas o mais fascinante foi meu rosto. Os traços eram suaves, retos, perfeitos. Eu estava mais bonita, e teria que me acostumar com isso.
Isso sem falar do modo como eu estava enxergando as coisas. Era tudo diferente, como se tivesse mexido no controle de brilho e contraste do mundo. Parecia que eu estava enxergando pela primeira vez. Tudo tão brilhante. Eu conseguia ver as partículas de pó no ar, conseguia ver os poros da pele de Robert, conseguia ver tudo com perfeita clareza.
Até o modo como eu reagia a odores mudou. Eu não precisava mais respirar, e disso tinha certeza, mas sabia que o olfato era o meu sentido mais precioso, que a minha caça dependia quase totalmente dele. Eu respirei uma vez, para ver como era. O ar passou pela minha garganta e eu pude sentir o gosto de tudo que estava à minha volta. O pó, as flores, a madeira, e até mesmo o gosto de Rob. Era delicioso, devo admitir. Cítrico como eu nunca imaginara. A vontade que eu tinha era de correr e beijá-lo.
- Rob...? – A voz que saiu da minha garganta não parecia me pertencer. Era como o soar de pequenos sinos.
Ele sorriu e me olhou, esperando que eu continuasse.
- Minha garganta arde. – Falei lentamente. Sede.
- Você consegue aguardar até o anoitecer? – Perguntou, enquanto se aproximava lentamente. Eu podia ver o temor em seus olhos vermelhos, ainda esperando que eu me exasperasse e perdesse o controle.
- Acho que sim. – Respondi, franzindo o cenho.
- Ótimo. O dia está ensolarado, não poderemos sair de casa. – Seu tom estava um pouco mais relaxado, mas eu ainda sentia a tensão.
Eu assenti e mirei-me no espelho novamente. Um batom vermelho me cairia bem, agora. E outra roupa, afinal, eu estava há três dias com a mesma.
- Onde...?
- No meu quarto. – Antes mesmo que eu pudesse concluir minha pergunta, ele já estava me guiando pela grande mansão afastada da cidade, até o andar de cima.
Nossa velocidade era desumana, mas mesmo assim eu conseguia enxergar tudo perfeitamente bem, como se estivesse parada. E o chão debaixo dos meus pés sumira por alguns instantes. Então eu estava parada em frente a um quarto de paredes claras e piso de madeira. Não havia cama, e eu sabia que isso se devia ao fato de que vampiros nunca dormem.
Minhas malas estavam ao lado de um divã branco coberto por livros e folhas. Em questão de segundos eu já havia trocado de roupa, e descia para procurar algo para fazer enquanto o Sol brilhava.
O Sol. Este seria um grande problema. Eu adorava o Sol, e o modo como ele iluminava meus cabelos, deixando-os dourados. Mas este era um luxo do qual eu havia aberto mão, e agora era tarde demais para lamentar. Eu sabia como a pele de um vampiro ficava quando esposa à luz do sol. Ela brilhava como se fosse milhares de pequenos diamantes, e eu não pretendia sair na rua assim. Chamar a atenção dos humanos era algo muito indesejável no momento.
O dia passou lentamente, sem que eu tivesse muito que fazer. Certamente eu aprendi algumas coisas, mas tudo em teoria. Na pratica seria totalmente diferente.
Quando a noite caiu, saímos para caçar. Eu ainda era extremamente inexperiente, mas consegui seduzir um homem grande e forte para um beco escuro. Ele cheirava extremamente bem, e me deixava com a boca cheia de veneno.
Joguei-o contra a parede com um sorriso assustador. Por um momento ele pensou que teria uma noite ótima de prazer, mas então se deu conta de que aquela seria sua última noite.
Com um movimento rápido, cravei minhas presas em sua jugular, sugando todo o sangue de seu corpo, rapidamente.
A sede ficara menor, mas nem assim foi embora. Eu precisava de mais. Eu queria mais.
Limpei o filete de sangue que escorria da minha boca com as costas da mão, e saí para a noite, à procura de mais uma presa. Dessa vez foi mais difícil.
Robert estava por perto, falando no ouvido de uma jovem de cabelos ruivos. Ele sempre disse que o sangue das ruivas era mais amargo. A lembrança me fez sorrir.
Eu atraía o olhar de todos os machos que passavam por mim. Eu estava encostada em uma parede, observando calmamente. Nenhum homem cheirava bem o suficiente para me chamar a atenção, e eu não queria beber o sangue de uma mulher. Não tinha uma boa razão, apenas não queria.
Um jovem de cabelos escuros passou por mim. Não tinha mais de 16 anos, e carregava um skate embaixo do braço. Lembrei-me de meu irmão humano. Se fosse possível, certamente as lágrimas escorreriam pelo meu rosto.
Seu cheiro era maravilhoso. Doce, lembrando-me de chocolate. Caminhei até ele sorrindo, como se fôssemos velhos amigos. Ele retribuiu o sorriso hesitante.
- Olá. – Eu falei, com a voz mais sedutora possível. Ele mordeu o lábio.
- Oi.
- Você poderia me ajudar, por favor? – Eu perguntei, ainda sorrindo.
O garoto franziu o cenho. Com certeza estava pensando em que poderia me ser útil.
- Hã. Claro. – Seu tom era inseguro.
- Eu estou procurando a pista de skate da zona norte. – Falei, tentando explorar a única preferência que eu sabia que ele tinha. – Você poderia-me dizer onde fica?
Imediatamente o garoto começou a falar.
- Siga em frente por essa rua, e dobre a esquerda. Caminhe mais uma quadra e dobre a direita, e depois a direita de novo. Você vai avistar uma praça. Atravesse-a e caminhe mais duas quadras para o leste, então dobre a esquerda e pronto. – Ele estava meio aturdido, sem saber por que exatamente respondera a minha pergunta com tanta rapidez.
Fiz a minha melhor cara de confusão.
- Será que você poderia... Levar-me até lá? – Eu aumentei o sorriso.
Sem pensar duas vezes, o jovem começou a me guiar.
Andamos duas quadras em silêncio, então eu avistei um beco escuro e me virei para o garoto.
- Venha comigo. – Minha voz era baixa e extremamente sedutora. Eu estava perdendo o controle, e ansiava cada vez mais pelo sangue dele.
O moreno me seguiu sem reclamar, e assim que chegamos ao meio do lugar, ele curvou-se para me beijar, deixando seu pescoço à mostra.
Aquela era a minha deixa. Puxei-o para perto de mim e, antes mesmo que ele pudesse piscar, jazia morto em meus braços. Minhas presas na sua jugular, como esteve há menos de uma hora atrás no homem forte. O gosto era delicioso. Por um momento cheguei a pensar que nunca provaria nada melhor.
Quando o corpo já estava seco, larguei-o deitado no chão e mirei sua face novamente. Era bonito. Certamente do tipo que eu namoraria se fosse humana. Mas como eu já não era mais, ele era do tipo que eu beberia o sangue, apenas por ser humano.
Com minha sede saciada, saí para procurar Robert. A última vez que o vira, ele estava com a menina ruiva. Voltei para o local onde me separei dele. Nem sinal.
Esperei por alguns minutos. Ele apareceu lindo sob a luz da lua. Sua face brilhava, e seus olhos cor de sangue estavam intensos. Aproximou-se de mim e encostou seus lábios nos meus, moldando-os ao formato de minha boca. Menos de um minuto depois, estávamos em casa, em um beijo de tirar o fôlego, se eu ainda o tivesse.
O gosto do sangue do rapaz ainda estava na minha boca. Eu senti-me culpada por ter tirado a vida de um humano tão jovem apenas por um luxo bárbaro. Parecia errado.
Mais uma vez o rosto de meu irmão apareceu na minha mente. Sacudi a cabeça para tirá-lo de lá. Não queria pensar nas coisas que deixei para trás. Iria dificultar demais a minha “não-vida” eterna.
Eternidade. Era isso que eu tinha no meu futuro. Será que haveria algum modo de sobreviver a ela sem ter que tirar mais vida de inocentes?
Eu não sabia a resposta para a minha pergunta, mas sabia que uma coisa a traria para mim.
Eternidade.
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- Vamos dar às boas vindas à Francesca, nossa nova personagem! Nove dos onze já deram as caras, e nos próximos dois dias os outros dois vampiros aparecerão!
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